O Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional (CCS) promoveu nesta segunda-feira (10) um debate sobre a Lei 15.100/2025, que restringiu o uso de celulares por alunos na educação básica. Os participantes destacaram a importância da lei, observando que não são contrários a essa tecnologia, mas que ela deve ser utilizada de forma saudável.
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Sancionada em 14 de janeiro, a lei determinou que crianças e adolescentes não podem mais utilizar de forma indiscriminada aparelhos eletrônicos portáteis, como celulares, nas escolas públicas e privadas de educação básica de todo o país. Com a norma, ficaram proibidos de usar os aparelhos eletrônicos portáteis (celulares e tablets, entre outros), durante todo o período na escola, os estudantes matriculados na educação infantil, no ensino fundamental e no ensino médio. Em sala de aula, o uso dos celulares passou a ser permitido apenas para fins pedagógicos ou didáticos, mediante orientação dos professores.
Estudos apresentados na audiência pública do CCS apontam que a maioria da população brasileira também se mostra favorável à proibição. E que os próprios estudantes reconhecem que o celular atrapalha sua concentração nas atividades escolares e nas tarefas de casa.
A diretora de apoio à Gestão Educacional no Ministério da Educação, Anita Stefani, mostrou dados do relatório do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) Brasil 2022, segundo os quais 93% de alunos com idade entre 9 e 17 anos usam a internet regularmente. Desse total, 98% dos entrevistados afirmaram que usa a internet por meio do celular.
Aplicado aos estudantes brasileiros no Pisa, o questionário revelou que 80% desses jovens afirmam que se distraem e têm dificuldades de se concentrar nas aulas de matemática, por exemplo, por causa do celular. O estudo é um comparativo internacional realizado a cada três anos pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
De acordo com Anita, crianças de 9 a 10 anos que responderam à pesquisa afirmaram que sua primeira experiência de acesso à internet, com celular, aconteceu antes dos 6 anos. Outro dado destacado pela convidada é que, apesar das proibições legais, muitas crianças e adolescentes possuem perfil ativo (conta) nas plataformas digitais.
“Quanto mais jovem é a criança, mais cedo foi seu acesso à internet, o que mostra que as famílias estão com mais dificuldade de manter crianças pequenas afastadas do celular e da internet”, comentou.
Conteúdo sensível
Anita considerou a restrição de idade para a criação de perfis na internet um ponto importante, e lamentou que a medida não seja totalmente cumprida no Brasil. Ela alertou para o fato de que crianças e adolescentes têm tido acesso a conteúdos sensíveis na internet, que podem afetar severamente sua saúde mental.
Segundo a pesquisa TIC Kids on-line Brasil – 2024, citada pela debatedora, 9% do total de crianças analisadas, entre 11 e 12 anos de idade, tentaram machucar a si mesmas. Esse percentual foi de 12% entre jovens com idades entre 15 a 17 anos. Os que buscaram formas para cometer suicídio devido ao acesso irrestrito à internet somaram 7%, tanto nas crianças entre 11 e 12 anos quanto nos jovens de 15 a 17 anos de idade.
Anita reforçou que a lei que restringiu o uso de aparelhos nas escolas não proíbe o porte do aparelho nessas instituições de ensino. Ela observou que o texto até incentiva o uso intencional dos equipamentos para o desenvolvimento das crianças e adolescentes.
“Não dá para negar a importância da tecnologia, mas precisamos usá-la com consciência e no intuito de promover o desenvolvimento dessas pessoas”, destacou a diretora.
Salvaguarda mental
A lei afirma que o objetivo da restrição é salvaguardar “a saúde mental, física e psíquica de crianças e adolescentes”, diante da usual utilização de celulares por parte dos estudantes durante o período de estudo nas salas de aula e nos momentos que deveriam ser destinados à socialização, como recreio ou intervalos entre as aulas.
A norma, no entanto, apontou algumas exceções. Além do uso para fins pedagógicos, os estudantes têm permissão para uso dos celulares, dentro ou fora da sala de aula, quando for preciso garantir a acessibilidade e a inclusão, e também quando for necessário atender às condições de saúde ou garantir direitos fundamentais.
O projeto que deu origem à nova legislação foi aprovado pelo Senado em dezembro. Atual secretário de Educação do município do Rio de Janeiro, Renan Ferreirinha foi o relator da proposta na Câmara dos Deputados. Ele considerou a sanção um marco para a educação brasileira, frisando que o tema se tornou o principal foco da discussão sobre educação no país no início do ano letivo de 2025.
Ferreirinha também destacou que o corpo docente não se mostra contrário às tecnologias nas escolas, mas ressaltou que a ferramenta é considerada importante, desde que usada de maneira consciente, responsável e com fins pedagógicos.
Ao apontar dados de uma consulta pública feita recentemente pelo governo do Rio de Janeiro sobre o tema, o debatedor disse que a restrição é bem sucedida no estado e vem diminuindo inclusive casos de bullying e cyberbullying. Ferreirinha observou ainda que a iniciativa de restringir o uso de celular em escolas partiu, entre outros fatores, do incômodo gerado entre os atores da educação pelo uso exacerbado das telas por crianças e adolescentes. Para ele, o assunto é uma “pauta de país”, sendo fundamental sua regulamentação para se promover um uso consciente da tecnologia nas escolas.
“No Rio de Janeiro, a gente já tinha desejo de realizar algo sobre isso. Começamos com a proibição de uso em todas as escolas, o que deu muito certo. Fizemos, depois, uma consulta pública para colher a opinião da população, na qual tivemos mais de 10 mil participações. Dessas, 83% foram a favor da proibição também nos intervalos das aulas, 11% se posicionaram favoravelmente à proibição somente na sala de aula e, apenas 6%, se mostrou contrária a qualquer tipo de impedimento”, informou o secretário.
Mudança almejada
Especialista em educação digital do Instituto Alana, Rodrigo Nejm considerou a escola o ambiente ideal para o uso pedagógico das diversas tecnologias existentes. De acordo com ele, a lei é um instrumento para as mudanças educacionais também almejadas pelos próprios estudantes e suas famílias.
“Estamos muito animados com a nova lei, pela chance que ela traz de amplificação do repertório digital entre os estudantes. É para eles poderem fazer com o celular [na escola] o que jamais fariam sentados nos sofás de suas casas. A gente tem destacado que a lei não significa de forma alguma menos educação digital, mas muito pelo contrário: ela traz um novo panorama de ainda mais educação digital e midiática. O que a gente precisa é apenas de um novo formato de implementação”, disse o debatedor.
